quarta-feira, 21 de dezembro de 2016

Pobreza: uma aproximação conceptual

A pobreza é a condição social de perpetuação do futuro adiado. A pobreza representa socialmente essa devolução sistemática, inexorável, à dureza do quotidiano, apesar dos intervalos do sonho, da expectativa, da contemplação, do regozijar-se no ócio, em suma, dessa suspensão temporal do dever, que nos transcende da economia do mundo. O tempo do homem pobre é estreitado socialmente até se tornar numa única forma de experiência do tempo: o presente. Limitando todo o seu potencial de acção ao horizonte da sobrevivência básica diária.

quarta-feira, 14 de dezembro de 2016

Cosmopolitismo internacionalista


Há medida que as placas tectónicas da política ocidental assistem a uma deriva de 180°. Consumindo na sua voracidade esse espaço que a ideologia do consenso intitula como "o centro" - para depois homologar esse centro à social-democracia. Há medida que os partidos não tradicionais vão ganhando expressão, e, em alguns casos, até eleições; forja-se outro grande consenso no circuito privado do cosmopolitismo internacionalista: que a globalização deixou a esmagadora maioria dos cidadãos "para trás". 

Face a este terrível diagnóstico, o que há a fazer? Resgatar de volta os olvidados, os náufragos. Redimensionar a política económica de forma a poder intensificar o processo de integração no universalismo cosmopolita: regressar aos velhos princípios da social-democracia. Não resta outra escolha para os que ficaram para trás - os pobres; os rurais; os iletrados... – senão deixarem-se empurrar para a frente. Como é piedoso o coração das elites… 

sábado, 20 de setembro de 2014

It´s all about bullshit - uma aproximação crítica à arte contemporânea

It´s all about bullshit.
A concorrência desenfreada e canibalesca à muito que chegou à cultura e ao mundo da criação artística em geral.  Os ditames dessa concorrência promovem a corrida louca por um lugar no espaço da arte, que, como em quase todos os âmbitos do mercado, não se prendem exclusivamente com a sobrevivência do mais apto. Nem sempre são os melhores (do ponto de vista discutível da qualidade artística!) que estão na vanguarda do reconhecimento nacional, e questões como a agenda, o conhecimento das amizades no círculo, a disponibilidade financeira e temporal, também condicionam sobremaneira a promoção - analogamente a todos os outros espaços concorrenciais.
O mais grave, no sentido do mais incisivo, nesta caracterização, será o risco dessa desconexão entre o mundo da arte (constituído pelo público e pelos actores já existentes no meio) e o mundo da vida (os potenciais interessados e público/consumidores a cativar), viciar de tal modo a produção da arte que as rupturas no seu seio (que originam novos movimentos ou novas formas de percepção, que produzem a história da arte) sejam exclusivamente causadas no âmago dos seus oligopólios e as dinâmicas do mundo comum, por estarem de tal modo alheadas desses circuitos internos, não tenham uma palavra a dizer ou não consigam provocar a sua própria cesura a partir desse olhar exterior.

It´s all about bullshit. Ainda que os artistas possam e devam ter o cuidado de justificar o sentido das suas produções. Ainda que possam estar mais ou menos comprometidos política e socialmente. Os laços que classicamente ligavam a criação artística, a produção cultural, ao próprio sentido da existência comunitária, estão cada vez mais frágeis e rarefeitos. Produz-se coisas (ainda que possam ser coisas artísticas!) sem que se procure elevar a sua unidade ontológica; produz-se para que estas permaneçam assim na propriedade do autor, nas suas bases justificativas e por todo o discurso postumamente realizado pelos seus críticos, algum público mais letrado e pelo próprio posicionamento do poder (do local ao nacional). Cada vez mais a arte circula pelo mundo da vida; os objectos da arte pelo mundo das coisas; sem que consiga superar a profanidade a que está votada e fornecer o ponto de cisão que obriga à redefinição de todas as outras coisas da vida com as quais a arte convive.